Depois de uma longa ressaca literária, vivendo de audiobooks e séries para lá e para cá, finalmente consegui retomar meu hábito de leitura. E que leitura viu? Adentrar em uma narrativa sem saber nada sobre é algo que dificilmente acontecia comigo, porém essa caixinha de surpresas conseguiu me fazer redescobrir o prazer que é ler um livro, ler cada palavra contida em páginas e páginas de uma história. E eu devo esse feito a Shaun David Hutchinson.
At The Edge of The Universe é uma história confusa que te faz duvidar de tudo que você está lendo. Nos é apresentado termos complexos de física quântica, teorias malucas que envolvem desaparecimento de pessoas da existência e até mesmo uma subta compressão do universo que engole tudo ao seu redor, reescrevendo cada linha da história dos personagens, sendo que apenas um deles está ciente do que está acontecendo: Oswald Pinkerton, ou para os mais íntimos, Ozzie.
A trama roda em torno de sua vida e dos acontecimentos que o levaram a essa espiral do universo: seu namorado desapareceu da existência, na qual ninguém lembra dele; o avião na qual ele estava indo para Seattle procurar seu namorado desaparecido cai de forma inesperada no momento em que levanta vôo, porém sem ele já que um policial ranzinza acaba o “salvando”; o universo está numa corrida desenfreada para se extinguir, diminuindo a cada instante. Entre descobertas, arrependimentos, amores e uma certa obsessão (ou um sério caso de dependência emocional), Ozzie traça seu caminho tortuoso em um processo de autodescoberta do que é amar e do que é viver.
Uma coisa que acho extremamente cativante nesse livro é a confusão intencional que o autor propõe. Você, junto com o personagem principal, está literalmente na mesma página o tempo todo, pois a dúvida é o que circunda toda essa narrativa. Os serás da vida são colocados a tona, os dramas da adolescência e as incertezas são escancaradas na sua face em meio a ferramenta sutil que o sci-fi intrínseco nessa história.
Com um elenco diverso e cativante (eu diria até mais cativante que o Ozzie), a história evolui de forma fluída nas narrativas que convergem com o plot principal. Tudo é muito bem construído, apresentando as nuances de cada personagem através de uma sutileza que é difícil de se conquistar. Existe um senso de identificação ali que vai se desenvolvendo ao longo da trama e que no final te abraça e fala “está tudo bem”, e realmente está tudo bem.
Agora falando do namorado deletado da existência: Tommy. Quem é Tommy? Através do olhar de Ozzie, é a pessoa mais perfeita do mundo, também a pessoa que mais sofreu. Ter sua existência apagada implica em diversos fatores: ele nunca teve a chance de sair daquele lugar, ele nunca teve a chance de dar uma vida melhor para sua mãe, ele nunca teve a chance de viver. A mensagem cravada na cabeça de Ozzie é extremamente clara: preciso salva-lo. Chega a ser cômico o complexo de white savior que nos é apresentado, pois é mostrada extrema vulnerabilidade, conceitos raciais e socioeconômicos por parte de todos os personagens, mas o que fica mais evidente é o namorado bi-racial, porque o nosso querido personagem principal não consegue enxergar fora da caixinha, mesmo querendo ajuda-lo de todas as formas possíveis, sem entender exatamente a dor que o Tommy, como uma pessoa em uma situação de extremo abuso, é obrigado a conviver. Durante a leitura, confesso que ficava meio irritado com a forma em que víamos o Tommy, pois era um olhar distorcido. Gostaria muito de uma história apenas dele para explorar o personagem, na qual ele pudesse contar sua própria história e não alguém colocando um filtro em todas as suas ações.
Em suma, o livro é destruidor. É um soco no estômago. As últimas páginas revelam algo que você vai pegando aos poucos, em meio a uma névoa de dúvidas e desespero. A realidade se torna cada vez mais brutal em cada página que se aproxima do fim e, no final… Acaba. Você respira, você se alivia. Confesso que eu não conseguiria associar esse livro se tivesse lido durante a adolescência, pois na época eu tinha uma visão realmente limitada do que era um relacionamento, e muito menos do que era o conceito de dependência emocional.
Por mais que “At The Edge of The Universe” não seja um livro cinco estrelas favoritado, eu realmente gostei da leitura e sinto que foi no momento certo, principalmente em relação ao momento que estou vivendo. Confesso que esse livro me destruiu e me deu algumas ferramentas para me reconstruir também. Juntar os caquinhos se torna cada vez mais fácil com o tempo e com algumas mensagens que te impactam, sendo que esse livro foi uma delas.