Edgar Allan Poe é considerado o pai da literatura gótica americana. Junto a H.P. Lovecraft, Poe redefiniu o terror literário de maneira visceral e assombrosa, mesclando assombrações com desilusões realistas. Mike Flanagan, um dos mestres do terror moderno, uniu muitos dos clássicos de Poe em sua mais recente produção, em parceria com a Netflix. Seguindo os passos de “A Maldição da Residência Hill” e “A Maldição da Mansão Bly”, “A Queda da Casa Usher” apresenta uma narrativa complexa em um universo sombrio.

Roderick Usher é um CEO corrupto de uma indústria farmacêutica e patriarca de uma família composta por filhos e bastardos excêntricos. Prestes a ser condenado em um julgamento pelas ações de sua empresa e abalado pela morte de todos os seus descendentes, Usher convoca um antigo rival para contar sua versão da história de sua queda, refletindo sobre a natureza destrutiva do poder, corrupção e deterioração moral. Durante seus relatos, a misteriosa figura de Verna surge, revelando-se essencial para a ascensão e queda da dinastia Usher.

A forma como Flanagan adapta e conecta diferentes contos de Poe, inserindo-os em uma narrativa moderna e envolvente, prende a atenção do espectador. Com rostos familiares de produções anteriores assumindo nomes de personagens clássicos, a minissérie cria uma dinastia completamente desprezível, onde a bondade e outros atributos positivos são punidos tanto pela família quanto pelo mundo. O personagem Arthur Dupin, inspirado em uma das criações mais icônicas de Poe, representa o equilíbrio moral em um universo corrupto, sendo ocasionalmente punido por isso.

A queda da dinastia Usher é retratada de forma gráfica, tanto visual quanto narrativamente. A arrogância e o orgulho são os principais causadores das tragédias de uma família que se considera intocável. Elemento-chave dos contos de Poe, as mortes agonizantes são intensificadas por visuais extremos e um design de som grotesco, indo de uma chuva ácida em uma festa hedonista até um chimpanzé que destroça uma das filhas de Roderick.

Carla Gugino dá vida ao espectro que une passado e presente da história como a enigmática Verna — anagrama de “Raven”, nome do poema mais famoso de Poe. Com uma atuação contida e uma elegância sobrenatural, Gugino incorpora essa criatura, alternando entre risos diante das desgraças dos Ushers e monólogos profundos que exploram a futilidade da condição humana. Como peça central da narrativa, essa versão do Corvo de Poe é singular.

Mesclar Flanagan e Edgar Allan Poe foi uma aposta ousada que se consolidou como uma das melhores produções do catálogo. Revisitar a condição e a moral humanas, bem como a conquista e a perda de poder, são temas eternamente relevantes. E, com um diretor intuitivo e brilhante como Mike Flanagan, essa premissa ganha uma nova roupagem.

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