A franquia Como Treinar o Seu Dragão ganhou proporções muito maiores desde o lançamento do primeiro livro de Cressida Cowell. Nas mãos de Chris Sanders e Dean DeBlois, o mundo dos vikings criado por Cowell foi livremente adaptado e expandido, transformando a amizade entre Banguela e Soluço em uma das mais queridas da história da animação. Com três filmes aclamados pela crítica, a trilogia percorreu a década de 2010 e conquistou o imaginário popular. Quinze anos após o longa original, DeBlois retorna à franquia com uma adaptação em live-action — a primeira da DreamWorks — que reimagina a história em uma nova dimensão.
Na ilha de Berk, dragões dominam os céus e aterrorizam seus habitantes, que os caçam há gerações. Soluço, um garoto franzino e filho do estoico Stoico, realiza o feito mais improvável de sua aldeia ao capturar, por acidente, o lendário Fúria da Noite — o dragão mais temido do mundo. Ao passar mais tempo com a criatura — apelidada de Banguela, devido aos seus caninos retráteis —, Soluço começa a questionar a visão que seu povo tem sobre os dragões. Enquanto essa improvável amizade floresce, uma ameaça de proporções colossais fumega no coração do Ninho dos Dragões — e apenas essa dupla inesperada poderá salvar Berk.
Quando DeBlois afirmou, em entrevistas anteriores ao lançamento, que usaria a animação de 2010 como guia para a nova versão, ele não exagerava: o longa recria falas e momentos com fidelidade quase cirúrgica, funcionando como uma versão expandida de seu clássico. Diferentemente de outras adaptações em live-action que falharam ao tentar se vender como versões mais “maduras” — como ocorreu com O Rei Leão (2019) —, esta produção não pretende substituir o original, mas sim existir como uma dimensão alternativa. Pode desagradar aos entusiastas da animação, mas os fãs da franquia receberam aquilo que muitos desejavam desde a conclusão da trilogia em 2019: a chance de reencontrar Soluço e Banguela mais uma vez. A nova roupagem da trilha sonora original evoca nostalgia, enquanto uma atmosfera mais sombria oferece novas lentes para enxergar essa história.
Mason Thames interpreta Soluço com charme e inocência semelhantes à versão animada, embora apresente o mesmo problema do Peter Parker de Andrew Garfield: um carisma “cool”, que destoa do papel de pária social. Nico Parker, conhecida por The Last of Us, tenta trazer mais profundidade à Astrid, mantendo o tom intimidador, ainda que mais próximo do arquétipo da valentona do que da guerreira impassível. Gerard Butler retorna a Berk, desta vez emprestando corpo e voz a Stoico, reafirmando o domínio absoluto sobre o personagem. Os demais coadjuvantes ganham alguma dimensão, mas permanecem pouco memoráveis.
Como sempre, o destaque recai sobre os dragões. Embora seus designs estejam menos estilizados por conta da estética live-action, o CGI confere peso e escala a essas criaturas fantásticas. Suas interações com o mundo físico — embora impossíveis — são surpreendentemente críveis, do titânico Morte Rubra ao camaleônico Terror Terrível. O Fúria da Noite continua tão adorável quanto antes, com seus olhos verdes expressivos e comportamento brincalhão que evocam a graça de felinos como gatos e panteras.
Em suma, o live-action de Como Treinar o Seu Dragão não tenta reinventar ou quebrar a roda, mas se compromete com honestidade e afeto a revisitar um universo querido. Se não traz grandes surpresas narrativas, entrega o conforto da familiaridade e a emoção de reviver uma amizade que marcou uma geração inteira. Para novos públicos, pode ser uma boa porta de entrada; para os antigos fãs, é um reencontro agridoce, mas acolhedor — como visitar um lar onde já se foi muito feliz.