Um coro natalino está à porta de uma mansão gótica, desejando feliz Natal à comunidade. Na sacada mais alta da casa, uma criatura se prepara para virar um caldeirão sobre os visitantes indesejados… Tudo isso enquanto seus patrões observam a cena, sorridentes. Assim começa A Família Addams, de 1991. O filme de Barry Sonnenfeld, estrelado por Christina Ricci e Anjelica Huston, apresentou essa icônica família a uma nova geração e cimentou os Addams na cultura pop de uma forma que poucos personagens conseguiram. Com uma nova adaptação programada para estrear na Netflix, é o momento ideal para revisitarmos a trajetória da Família Addams.

Nas décadas de 1940 e 1950, o cartunista Charles Addams publicou uma série de charges nas quais uma família excêntrica se divertia em situações macabras e sombrias. As tirinhas eram permeadas por um humor cínico e mórbido, frequentemente abordando temas como a morte, a tortura e o sobrenatural.

Com o tempo, os quadrinhos se tornaram tão populares que deram origem a uma série de televisão. Embora o tom da produção fosse mais leve e as situações mais cômicas, o sitcom lançado em 1964 foi um sucesso, mesmo tendo durado apenas duas temporadas.

Um dos elementos que contribuíram para o fascínio do público foi o contraste com o ideal da família americana tradicional: Gomez, o patriarca, não trabalha; Morticia, a elegante matriarca, é tratada como sua igual; e a decoração da mansão mistura elementos de diferentes culturas do mundo, em contraste com o padrão eurocêntrico da época. É importante lembrar que, nos Estados Unidos da década de 1960 — um ambiente particularmente hostil a quem se afastava das normas sociais —, um programa com personagens descendentes de imigrantes (como Gomez) e bruxas (como Morticia) fazia sucesso. Uma ironia digna dos próprios Addams.

Embora a família tenha permanecido popular nas décadas de 1970 e 1980, foi com os dois filmes lançados nos anos 1990 que os Addams reencontraram o grande sucesso. Nessa versão, Gomez, Morticia e Wednesday ganharam vida nas interpretações marcantes de Raul Julia, Anjelica Huston e Christina Ricci. O humor cínico e sombrio dos quadrinhos estava de volta, desta vez amplificado pela estética gótica e pela atmosfera carregada de elementos atemporais. O primeiro filme gira em torno do retorno de um membro desaparecido da família — ainda que todos desconfiem de que nem tudo é o que parece. A ambientação abraça o insólito com naturalidade, sendo recebida com entusiasmo pelo público.

 

A sequência, Addams Family Values, mostra a família lidando com a chegada de dois novos personagens: o caçula de Gomez e Morticia, e uma psicopata disfarçada de babá que está de olho na fortuna dos Addams. O humor ácido e cruel permeia o filme inteiro, conquistando os fãs mais fiéis da franquia.

Apesar de algumas tentativas posteriores — incluindo uma com Tim Curry, curiosamente —, a presença da família Addams no imaginário popular arrefeceu após os anos 1990. Nenhuma das adaptações seguintes conseguiu reproduzir o mesmo impacto dos filmes originais. O humor macabro, por vezes, soava infantil, e o peso nostálgico das produções anteriores acabou ofuscando as novas versões.

Agora, uma nova tentativa se anuncia, desta vez pelas mãos de ninguém menos que Tim Burton. Na série Wednesday, programada para estrear ainda este ano, acompanharemos a primogênita dos Addams em uma aventura envolta em mistério, morte e caos.

Ao fim, os Addams seguem atemporais — e suas morais, mais atuais do que nunca. Seja desafiando o modelo da família tradicional americana dos anos 1960 ou apresentando novas gerações ao maravilhoso universo do humor cínico, uma coisa é certa: essa família gótica ainda tem lugar garantido no imaginário coletivo. E, se tratada com o devido cuidado, ainda pode nos proporcionar tempos deliciosamente miseráveis.

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