‘Central do Brasil’, de Walter Salles, é amplamente reconhecido como um dos melhores filmes brasileiros. A parceria entre o diretor e Fernanda Montenegro trouxe reconhecimento internacional ao cinema nacional, elevando a percepção sobre sua qualidade. Agora, Salles volta a colaborar com a família Torres em ‘Ainda Estou Aqui’, adaptação do livro de Marcelo Rubens Paiva, ambientada no regime militar.

Durante o governo do General Médici, um dos períodos mais tensos do governo militar, a família Paiva vive à beira-mar. A rotina se transforma quando Rubens Paiva, engenheiro e ex-deputado federal, é preso e desaparece sem deixar rastros. Eunice, sua esposa, passa a sustentar a família financeiramente e psicologicamente, enquanto busca respostas sobre o paradeiro do marido.

Ao contrário de outras produções que retratam o regime pelos olhos de guerrilheiros, ‘Ainda Estou Aqui’ mostra a repressão sob a perspectiva de uma civil, inicialmente alheia à violência do período. As cenas de tortura são apenas sugeridas, o que acentua a tensão interna e o clima opressor do filme. Dentro da casa dos Paiva, outrora cheia de alegria, o ambiente se torna sombrio, refletindo o sofrimento das filhas e o isolamento de Eunice. Quando recebe a certidão de óbito de Rubens, ela enfrenta a dor do fechamento da história.

O elenco coadjuvante também se destaca, com ótimas atuações de Selton Mello, Luiza Kowalski, Humberto Carrão, Dan Stulbach e Fernanda Montenegro em uma participação especial. No entanto, a alma do filme é a personagem de Eunice, interpretada por Fernanda Torres. Semelhante à mãe em alguns aspectos, Torres usa emoções contidas para criar cenas intensas e comoventes, transmitindo o turbilhão interior de Eunice, que, após a tragédia, se formou em Direito e tornou-se defensora dos direitos indígenas.

A direção de arte transporta o espectador para o Rio de Janeiro dos anos 1970, em meio ao Milagre Econômico e à presença militar. A filmagem amadora de uma das filhas proporciona um olhar diferenciado, enquanto a trilha, ao contrário da marcante em ‘Central do Brasil’, valoriza o silêncio, onde cada ruído e transmissão são significativos.

‘Ainda Estou Aqui’ estreou no Festival de Veneza em 2024 e foi aclamado, com Fernanda Torres já cotada para o prêmio de Melhor Atriz. Com essa nova parceria de Salles e a atuação de Torres e Montenegro, o cinema brasileiro tem uma oportunidade singular de reconhecimento internacional.

‘Ainda Estou Aqui’ é um filme denso e claustrofóbico, com interpretações impecáveis e uma perspectiva inédita. Entre um marido deputado transformado em pária e um filho escritor, a história de Eunice Paiva finalmente vem à tona.” 

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