Após a derrota do Terceiro Reich, as forças aliadas conduziram uma série de julgamentos para punir membros do alto escalão nazista pelos crimes hediondos cometidos contra a humanidade. Com um tribunal composto por juízes americanos, soviéticos, franceses e ingleses, os réus foram sentenciados a diferentes penas, que variavam de alguns anos de prisão à prisão perpétua ou à execução por enforcamento. A escolha de Nuremberg como sede do julgamento teve um forte simbolismo: a cidade, que antes sediara os grandes comícios do partido nazista, agora representaria o fim definitivo do regime de Hitler. Esse evento histórico se tornou material para inúmeros livros, documentários e um dos filmes mais importantes sobre justiça e guerra: ‘Julgamento em Nuremberg’ .  

O filme, dirigido por Stanley Kramer, acompanha o juiz americano Dan Haywood , que chega a Nuremberg para presidir o julgamento de juízes alemães que aplicaram as leis nazistas e agora alegam inocência quanto aos demais crimes de guerra. O advogado de defesa, Hans Rolfe, argumenta que, para condená-los, seria necessário “julgar toda a Alemanha”, enquanto as potências aliadas já conspiram para a divisão do país entre capitalismo e comunismo. Durante o julgamento, Haywood se aproxima da viúva de um oficial nazista executado e se depara com a difícil questão moral: como um país inteiro poderia ter ignorado as atrocidades cometidas durante o Terceiro Reich? E, mais perturbador ainda, como aqueles que deveriam zelar pela justiça se tornaram seus primeiros transgressores? 

O longa revisita a Alemanha do pós-guerra e as brutais consequências dos crimes nazistas, mas sem demonizar completamente os civis alemães. Kramer equilibra acusações contundentes com uma abordagem que também mostra o sofrimento da população, exemplificado na figura enigmática de Frau Bertholt. Viúva que perdeu tudo na guerra, ela despreza os soldados americanos, responsabilizando-os pela destruição de sua vida, mas ao mesmo tempo tenta convencer Haywood de que seu povo desconhecia as barbáries do regime. A trilha sonora reforça esse dilema: canções populares alemãs, como Lili Marlene, evocam tanto a resistência de um povo quanto a cumplicidade silenciosa de muitos.  

O filme também não se furta a expor as contradições dos aliados. Em uma defesa desesperada, o advogado Rolfe questiona o papel de potências como os Estados Unidos e o Reino Unido, que só passaram a agir contra Hitler quando ele ameaçou suas soberanias. Além disso, a relação dos americanos com a Alemanha pós-guerra sugere uma dinâmica de exploração sob a fachada de reconstrução democrática. 

O elenco de ‘Julgamento em Nuremberg’ é um espetáculo à parte. Spencer Tracy encarna o carismático, porém estoico, juiz Haywood, determinado a garantir um julgamento justo. Maximilian Schell entrega uma atuação premiada, explosiva e ao mesmo tempo contida como o advogado de defesa que tenta justificar o injustificável. Marlene Dietrich dá vida à solitária e ambígua Frau Bertholt, cujas hipocrisias servem tanto para isentar quanto para condenar seu povo. Judy Garland, indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante, emociona como uma testemunha profundamente traumatizada pelo nazismo. O elenco ainda conta com Burt Lancaster, William Shatner e Montgomery Clift, todos brilhantes em seus respectivos papéis.  

Mais do que um filme de tribunal, ‘Julgamento em Nuremberg’ é um estudo poderoso sobre culpa, moralidade e as complexidades da justiça pós-guerra. Ao mesmo tempo que condena os crimes nazistas, o longa provoca reflexões sobre os interesses políticos das nações vencedoras e a responsabilidade coletiva de um povo diante da História. Meio século depois de seu lançamento, a obra continua atual, reafirmando que a justiça não pode ser seletiva e que, diante dos horrores do passado, a humanidade deve sempre buscar o acerto de contas com a verdade.

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