O segmento “In Memoriam” do Oscar de 2004 trouxe uma surpresa para muitos espectadores: o nome de Leni Riefenstahl. Reconhecida como a “Mãe do cinema nazista”, sua inclusão ao lado de grandes nomes como Elia Kazan e Gregory Peck gerou controvérsias a muitos membros da audiência, que pararam de aplaudir, confusos. Apesar de sua ligação com um dos regimes mais sangrentos da história, sua menção em um segmento criado para honrar responsáveis por grandes feitos cinematográficos é, no mínimo, compreensível devido à relevância técnica de suas obrasa. Riefenstahl é frequentemente estudada por especialistas em cinema por sua inovação técnica em um período majoritariamente dominado por homens , mesmo que sua associação com o nazismo torne sua trajetória altamente polêmica.

Helene Bertha Amalie Riefenstahl nasceu em 22 de agosto de 1902. Iniciou sua carreira artística como dançarina, mas uma lesão no joelho a afastou da dança e a levou ao cinema, que vivia um momento de efervescência durante a República de Weimar. Na década de 1920, destacou-se como atriz em produções que exaltavam a natureza e a resistência humana. Um de seus papéis mais notáveis foi em “The Holy Mountain”(1926), dirigido por Arnold Fanck, que a introduziu no universo dos filmes de aventura.

Riefenstahl com as atrizes Anna May Wong e Marlene Dietrich; 1932

Nos anos 1930, Riefenstahl começou a dirigir, algo incomum para mulheres na época. Seu interesse pela direção surgiu ao observar técnicas de filmagem enquanto atuava. Sua estreia como diretora foi com “Das Blaue Licht” (A Luz Azul), de 1932, no qual também atuou. O filme, elogiado por sua estética inovadora e por capturar a beleza da natureza, consolidou sua reputação como uma cineasta promissora.

A vida de Riefenstahl mudou em 1932, quando conheceu Adolf Hitler. Ele admirava seus trabalhos e a convidou a produzir filmes de propaganda para o Partido Nazista. Aceitando a proposta, ela produziu um documentário sobre um dos muitos comícios nazistas em Nuremberg. Seu trabalho mais controverso, porém, foi “Triumph des Willens” (O Triunfo da Vontade), de 1935, que retratou o Congresso do Partido Nazista em Nuremberg. Este filme, considerado um marco do cinema por suas técnicas inovadoras, como tomadas aéreas e ângulos dramáticos e tornou-se uma das peças mais eficazes de propaganda política já feitas.

Outro trabalho de destaque foi “Olympia” (1938), um documentário sobre os Jogos Olímpicos de Berlim em 1936. A obra foi aclamada por suas sequências visuais impressionantes e pelo pioneirismo técnico, como o uso de câmeras subaquáticas e lentes teleobjetivas. Durante a guerra, Riefenstahl utilizou prisioneiros Romani como figurantes em algumas produções e manteve correspondência com Hitler, encontrando  pela última vez em 1944, após a morte de seu irmão- algo que muitos afirmam que foi o início de sua desilusão com o ditador e seus ideais.

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, Riefenstahl foi presa e julgada por suas ligações com o regime nazista. Ela negou ser simpatizante ou membro do partido, afirmando que sua colaboração era apenas artística, não política. No entanto, sua defesa foi amplamente rejeitada, e ela foi considerada uma “seguidora” do regime, sem envolvimento direto nos crimes de guerra. Sua carreira cinematográfica foi destruída, e ela se tornou uma persona non grata na indústria.

Nas décadas seguintes, Riefenstahl se reinventou como fotógrafa, concentrando-se nas tribos Nuba, no Sudão. Suas fotos receberam aclamação embora continuasse uma figura controversa. Em 2002, aos 100 anos, lançou seu último filme, um documentário subaquático. Ela faleceu em 2003, aos 101 anos.

A Carreira de Riefenstahl e seu terrível legado foi adaptado para diferentes meios no cinema contemporâneo. Apesar de “Triunfo da Vontade” simbolizar os feitos e elevar o partido de Hitler a parâmetros titânicos, estéticas proporcionadas pelo mesmo mudaram a maneira que regimes autocratas eram representados em mídias de ficção: O Império de Palpatine em “Star Wars” e de Coriolanus Snow em “Jogos Vorazes” é amplamente agraciado com estéticas semelhantes as feitas por Leni. O trabalho em “Triunfo” chegou até no mundo da animação, sendo replicado em “O Rei Leão” durante a ascenção de Scar, após a morte de Mufasa 

O legado de Leni Riefenstahl permanece ambíguo. Apesar de suas contribuições revolucionárias para o cinema, sua associação com o nazismo e o impacto de seus filmes de propaganda são um lembrete de como a arte pode ser usada para fins destrutivos. Enquanto críticos reconhecem seu gênio técnico, sua carreira é um exemplo do peso ético que acompanha a arte quando usada para promover ideologias nefastas.

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