Andrew Lloyd Webber é o cérebro por trás de inúmeros musicais célebres do século XX. Suas composições premiadas tornaram-se extremamente populares, enraizando-se profundamente na cultura pop. Contudo, um aspecto que se destaca com o passar dos anos é a falta de eficácia em muitas das adaptações de seu trabalho, como “Cats”, “O Fantasma da Ópera”, “Jesus Cristo Superstar”, entre outros. Uma das raras exceções é a adaptação de 1996 de seu clássico “Evita”, que, mesmo segundo seus próprios critérios, está longe da perfeição.

Dirigido por Alan Parker, o filme reconta a história da primeira-dama argentina, Eva Perón, e sua ascensão social, partindo de atriz de filmes B até se tornar uma figura mitológica no país sul-americano. Durante dezessete anos, diversas versões da história tentaram sair do papel, com talentosas atrizes cotadas para interpretar ‘Santa Evita’: Meryl Streep, Elaine Paige, Glenn Close, Barbra Streisand, Liza Minnelli, Sigourney Weaver e Michelle Pfeiffer estão entre os nomes que disputaram o papel de Perón.

Madonna e Jonathan Pryce foram escolhidos para interpretar Eva e Juan Perón, respectivamente, enquanto Antonio Banderas assumiu o papel de narrador da história. A decisão de escalar a cantora como protagonista, tomada após longas discussões com o diretor, causou revolta entre os argentinos, especialmente os ‘novos peronistas’. Grafites desfavoráveis a Madonna e Alan Parker enfeitaram as ruas de Buenos Aires durante os anos de produção.

Assim como na peça musical, a direção da história retrata a Primeira-Dama como uma oportunista ambiciosa que se torna uma protetora das minorias na Argentina. Apesar de ligeiramente sexista, o drama musical procura destacar a importância de Eva para o governo de seu marido e como sua morte foi um ponto crucial para ele. O filme desvincula o narrador da figura polêmica de Che Guevara, aproveitando o apelo sexual que Antonio Banderas possuía na época.

Uma figura crucial para o filme foi o presidente argentino Carlos Menem: liderando um país recentemente saído de um regime militar, o político disponibilizou cerca de 50.000 figurantes, garantiu liberdade de expressão à equipe e autorizou a gravação de algumas cenas na Casa Rosada, sede presidencial do país. Cenas como “New Argentina” e o cortejo fúnebre de Evita foram filmadas em Budapeste.

Com uma cinematografia que confere ao filme uma estética reminiscente do sépia, a produção possui uma direção de arte rica, mergulhando o espectador na América Latina dos anos 1950. Madonna passa por mais de 80 trocas de figurino ao longo do filme,  cada um mais bonito e elegante que o outro. O sempre talentoso Jonathan Pryce brilha no papel do General Juan Perón, enquanto Banderas encanta como o multifacetado Che.

A performance de Madonna tem sido objeto de discussão há décadas, inclusive por parte da atriz original do papel, Patti Lupone. Com uma caracterização quase perfeita e aparentando se entregar totalmente ao papel, a cantora enfrenta dificuldades em cenas dramáticas e em manter o peso que elas simbolizam. Seu alcance vocal é um dos aspectos mais criticados, onde a “Material Girl” não consegue reproduzir o estilo operístico de muitas das baladas de Lloyd Webber. Madonna demonstra um grande controle corporal e postural, conferindo credibilidade às diferentes fases da vida da política. Não é uma performance horrível como muitos afirmam, mas, no mínimo, medíocre.

O filme de Alan Parker rendeu a Madonna um Globo de Ouro de Melhor Atriz e a Andrew Lloyd Webber e Tim Rice o Oscar de Melhor Canção Original. Quase trinta anos após seu lançamento, o longa serve como uma sólida introdução para aqueles que desconhecem a história da Primeira-Dama argentina. O poder iconográfico de Evita se mostra cada vez mais vivo, com a ideia de sua silhueta tão icônica causando comoção quando Madonna subiu ao balcão da Casa Rosada.