Uma amiga me recomendou esse livro em uma das muitas vezes em que conversamos (lê-se: eu reclamei) sobre a escassez de livros com protagonistas no espectro da assexualidade ou arromanticidade. Na época, eu conhecia apenas um. Graças a ela, agora conheço, no total, dois livros com esses requisitos.

Georgia Warr está passando pela transição do ensino médio para a vida universitária e tudo o que isso envolve. Sair da casa dos pais. Fazer novas amizades (e inimizades). Lidar com novas pressões, e sentir mais intensamente as antigas. Sem ter algum dia se apaixonado ou trocado beijos, Georgia é a última das românticas. Teoricamente. Na prática, recusou sem hesitar todas as oportunidades que a vida lhe deu de viver algo digno das fanfics que ela adora ler. Só vê “química” quando é uma observadora distante e não um dos reagentes. Nessas circunstancias, começa a achar que tem algo errado com ela. Através do novo circulo social, se depara com os conceitos de assexualidade e arromanticidade.  O abalo em sua visão de mundo leva Georgia a tomar uma série de decisões questionáveis na tentativa desesperada de evitar o que ela imagina ser uma vida “Sem amor”.

Esse livro é uma exibição da versatilidade de Alice Oseman. A mesma pessoa que criou HEARTSTOPPER (romance meigo com aquele casal de conforto), faz picadinho do conceito de amor nesse livro…

Arte de personagens feita por Alice Oseman. Garota segurando a baideira do orgulho sendo carregada nas costas de outra usando uma camiseta com as cores da bandeira panssexual e segurando a mão da de uma terceira garota, carregando as bandeiras da assexualidade e arromanticidade.

…e o reconstrói de várias maneiras, cada uma tão válida e necessária quanto outra, através da protagonista. A ideia do romance guia a trama a medida que as tentativas de Georgia de se aproximar desse ideal a levam no sentido oposto.

A narrativa em primeira pessoa garante lugar de camarote nos surtos internos da protagonista. E vista de primeira fila nos surtos dos amigos dela. Todo mundo se descobre, encobre, ama e odeia de jeitinhos únicos.

É fácil se identificar com os dilemas de Georgia, mesmo para quem não se encontra nos espectros da arromanticidade e assexualidade, porque eles envolvem lacunas nas pressões e representações sociais que em geral são pouco exploradas e muito sentidas. Pressão romântica colocada sobre amizades. Hierarquia das formas de laços afetivos. Opressão dentro da própria comunidade LGBTQIAP+. O processo de separar aquilo que sentimos o dever de querer daquilo que de fato queremos. E outras imposições sociais de origem desconhecida.

“Sem amor” é um título enganoso, pois amor é o que mais tem neste livro.

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